Dez anos depois de darem por terminada a sua carreira, os Ornatos Violeta continuam a preencher o imaginário de todos, sendo, na verdade, A banda de culto do rock nacional. Quando, no ano passado, anunciaram que iriam regressar para um pequeno número de concertos, milhares de pessoas correram às bilheteiras, esgotando por completo todas as datas agendadas para os coliseus de Lisboa e Porto. Ontem, no primeiro de três concertos agendados para Lisboa, sentiu-se que o verdadeiro amor nunca morre. Os fãs acumularam-se, ainda cedo, à porta do Coliseu, com cachecóis com as palavras “Tour 2012 – Ornatos Violeta” a darem as boas-vindas ao coletivo, qual equipe de futebol.
A banda composta pelo icónico Manel Cruz, Nuno Prata, Peixe, Elísio Donas e Kinörm proporcionou, desde o primeiro minuto, um fabuloso e verdadeiro regresso ao passado. O palco minimalista, composto apenas por holofotes de luz que dançavam entre o violeta e o amarelo, contribuiu para a magia que todos assistiram, sem pestanejar. Nota-se que os anos passaram por aquelas quatro pessoas (alguns cabelos grisalhos e algumas rugas imperam), mas a jovialidade da alma mantém-se. Acima de tudo, os Ornatos Violeta demonstraram que não são mais uma banda a reaparecer por autopromoção, mas sim devido a uma enorme vontade do público, e foi com um respeito amplamente visível que Manel Cruz afirmou: “este concerto é uma festa vossa. Se não fossem mesmo vocês, nós não estávamos aqui”.
O alinhamento, esse, causava algumas expetativas, mas todas acabaram por ser correspondidas, e em larga escala. Ao todo, 35 canções desfilaram pelo Coliseu, umas entoadas a plenos pulmões, outras apenas saboreadas pelos ouvidos e olhar atento dos presentes. “Cão” e “O monstro precisa de amigos” foram praticamente tocados na íntegra, interligados por algumas raridades incluídas na reedição dos seus dois discos.
Por entre os êxitos Para Nunca Mais Mentir, A Dama do Sinal, Mata-me Outra Vez e Dia Mau, surgiram alguns inéditos, como Os Sítios onde eu o Esqueço e Gato com Dois Chifres. O role de canções sábias e poesias sentidas nos lábios de todos os presentes deu origem a momentos surpreendentes, e que o diga o rapaz desconhecido, de nome João, que levou um cartaz com a frase “Deixa-me tocar”, que fez Manel Cruz interpelá-lo, convidando-o para subir ao palco, deixando-o boquiaberto, mas ainda assim lúcido para desempenhar o papel que lhe foi emprestado em Deixa Morrer na perfeição. Há melhor demonstração de simplicidade e amor de um grupo pelos seus admiradores? São eles que traçam o destino de uma banda e Manel Cruz e companhia sabem disso.
Houve ainda tempo para relembrar as primeiras músicas do grupo, ainda do tempo do primeiro vocalista – Ricardo Almeida – o qual Manel Cruz fez questão de relembrar, ao interpretar Sacrificar
Três horas de concertos tornam difícil a tarefa de escolher um único momento alto ou inesquecível do espetáculo. O colectivo mais parecia um tocador de discos pedidos, interpretanto, sem parar, êxito atrás de êxito, com o apoteótico Ouvi Dizer a ganhar uma dimensão mágica, bem distante da que nos chega através da sua grande rodagem radiofónica, ao vivo. Intemporal.
E é essa a grande sensação final – a de intemporalidade. O público não queria que o concerto terminasse e o grupo ainda lhe fez a vontade, oferendo-lhe três encores, que contemplaram Punk Moda Funk, O Amor é Isto e uma Raquel, com Manel Cruz sozinho em palco com a sua guitarra, e com uma multidão a cantar a canção. Para-me Agora e Dias de Fé encerraram o espetáculo com chave de ouro e sucumbiram a uma chuva de aplausos.
Os Ornatos Violeta ultrapassaram uma mudança de século. Contudo, as suas letras, que marcaram toda uma geração, perduram no tempo, robustas, atuais, e continuam a fazer parte da vida de tantos jovens de hoje em dia. Arriscamo-nos a dizer que, todos os dias, os Ornatos Violeta ganham um novo admirador. Este pode ser o fim definitivo dos Ornatos, no que diz respeito aos espetáculos ao vivo, mas, na memória e nos nossos corações, eles continuarão para sempre vivos. A sensação de gratidão é dos mais nobres sentimentos que podemos ter na vida e foi essa mesma sensação que todos os elementos do grupo demonstraram no último adeus ao público. Obrigada, Ornatos.
Setlist:
1. Para Nunca Mais Mentir
2. A Dama do Sinal
3. Tanque
4. Pára de Olhar para Mim
5. Um Crime à Minha Porta
6. Mata-me Outra Vez
7. Dia Mau
8. Os Sítios onde eu o Esqueço (inédito)
9. Gato com Dois Chifres (inédito)
10. Há-de Encarnar
11. Chaga
12. Sacrificar (inédito)
13. Coisas
14. Débil Mental
15. Bigamia
16. 1 Beijo = 1000
17. Nuvem
18. Deixa Morrer
19. Notícias do Fundo
20. Ouvi Dizer
21. Capitão Romance
ENCORE
22. O.M.E.M.
23. Punk Moda Funk
24. O Amor É Isto
25. Homens de Princípios
26. A Metros de Si (inédito)
27. Tempo de Nascer
ENCORE 2
28. Raquel
29. Marta
30. Chuva
31. Devagar
32. Como Afundar
ENCORE 3
33. Bebe e Cai (inédito)
34. Pára-me Agora
35. Dias de Fé
Fotografias: Filete
Texto: Ana Cláudia Silva
Nenhum comentário:
Postar um comentário