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sábado, 31 de março de 2012

Fita cassete faz 50 anos e resiste ao digital através de pequenos selos

Fita cassete faz 50 anos e resiste ao digital através de pequenos selos:
RIO - Uma charge que circula pela internet mostra um walkman de capa e capacete pretos falando para um iPod branco: "I am your father" (Eu sou o seu pai), numa alusão à célebre frase de Darth Vader para Luke Sywalker no filme "O império contra-ataca", de George Lucas. A brincadeira ganha um sentido todo especial em 2012, quando a fita cassete completa 50 anos. Enquanto o aparelho criado da Sony parou de ser produzido no Japão em sua versão original em 2010, a pequena fita cassete, inventada pela Philips em 1962 e carinhosamente apelidada de K7, resiste ao seu fim várias vezes anunciado.
Em pleno reinado dos players digitais, ela respira sem a ajuda de aparelhos, mantendo-se através de pequenos selos no Brasil (como o mineiro Pug Records) e no exterior, sempre em tiragens limitadíssimas. Além disso, sua imagem e seu formato ainda inspiram de aplicativos — como o Stereolizer, que simula um rack de gravação em cassete — a obras de arte — como as criações da artista americana Erika Iris Simmons, feitas com pedaços de fita —, além de vários produtos de consumo pop.
— Sou louco por fitas cassete e tenho uma grande coleção que escuto no toca-fitas que ainda tenho no carro. Meus caronas nem acreditam quando descobrem isso — garante o cantor americano de folk rock Kurt Vile, que se apresenta no dia 13 de abril, no Circo Voador, ao lado de Thurston Moore, do Sonic Youth, autor do livro "Mix tape: The art of cassette culture", lançado em 2005. — Quero fazer como os meus amigos do Dinosaur Jr. e relançar meus discos em cassete. Esse formato é parte da História da música.
Vile se refere à iniciativa do Dinosaur Jr, um dos mais amados grupos de rock alternativo dos Estados Unidos, que relançou, no fim do ano passado, três álbuns no hoje inusitado formato de fitas cassete. Intitulada "The cassete trilogy", a caixa, de apenas 500 cópias, trazia os discos "Dinosaur", "You’re living all over me" e "Bug".
Em 2011, outros dois grupos também entraram nessa onda retrô. O Animal Collective lançou uma fita cassete com quatro músicas inéditas. O Of Montreal foi mais longe e lançou, em outubro, uma caixa (de madeira) contendo dez discos da banda em versão cassete. As iniciativas replicam, de certa forma, uma outra, bem anterior, feita pelo Radiohead, que, em 1997, quando os CDs já dominavam o mercado, lançou "Ok Computer" também nesse formato — a fita pode ser encontrada, ainda hoje, na Amazon.
Dois anos depois, já escasseando nas lojas, a fita cassete foi o meio encontrado por um grupo brasileiro para se lançar para o estrelato indie.
— Na época, uma cópia em CD não era tão fácil ainda. Marcelo (Camelo) e eu colecionávamos fitas-demo das bandas de que gostávamos; esse era, então, o meio mais natural para a gente lançar o Los Hermanos — conta Alex Lerner, produtor do grupo. — As fitas eram feitas manualmente num double-deck lá de casa. Todo o dinheiro que ganhávamos com a venda era reinvestido na compra de novas TDK 60.
— Lembro que lançamos três fitas: duas com cinco músicas inéditas em cada e uma coletânea das duas — completa o baterista Rodrigo Barba. — Eu tenho um 3 em 1 no qual ainda dá para escutar todas essas fitas.
A iniciativa do Los Hermanos de se lançar através de fitas cassete em 1999 não parece muito nostálgica ou distante para Amanda Dias, André Medeiros e Eduardo Vasconcelos, o trio responsável pela gravadora Pug Records. Criada em Juiz de Fora em 2010, ela é especializada em lançamentos no formato. Impulsionada pelo interesse do público em lançamentos analógicos (dos quais os vinis são os mais fortes representantes), a Pug já lançou fitas de bandas independentes, como Coloração Desbotada, Top Surprise e a apropriadamente chamada Duplodeck.
— As fitas cassete não foram a última alternativa para lançar $selo. Na verdade, foram a primeira — conta Eduardo Vasconcelos. — Embora tenhamos em torno de 25 anos e sejamos da geração MP3, achamos esse formato muito atraente. Ninguém valoriza comprar MP3. A fita é uma forma de as pessoas ouvirem a música de forma não banalizada, numa ordem proposta pelo artista. Além disso, há todo o fetiche em torno da fita, do ato de apertar o "play" e o "pause".
Boa parte da produção da Pug Records — que também lança seus artistas em formato MP3 — é distribuída nos Estados Unidos por uma gravadora irmã, a Lost Sound Tapes. Baseada em Seattle, ela faz parte de um pequeno grupo de nanicas — Joyful Noise e Croked Beat Records, entre $— que mantém o formato vivo nos EUA, apesar das estatísticas pouco favoráveis. Segundo uma pesquisa da Nielsen SoundScan, foram vendidas 22 mil fitas cassete nos EUA em 2011, um número irrisório se comparado com as 442 milhões de unidades vendidas em 1990.
— As fitas cassete nunca desapareceram, elas apenas não são mais registradas pelo >sav<mainstream — diz Jon Manning, que fundou a Lost Sound Tapes em 2005. — Elas permitem a audição de um disco de forma linear, valorizando o álbum como um todo. Claro que o mundo está caminhando rumo ao digital, mas há também essa pequena reação dos analógicos. Por isso, não me sinto um lobo solitário no mercado.
A sobrevida das fitas cassete em tempos digitais pode estar virando traço nas estatísticas do mercado, mas tem chamado a atenção de jornais como "Washington Post" e "Guardian", e revistas como "Spin" e "Rolling Stone", que publicaram recentemente reportagens sobre o assunto.
Documentário em produção
Um enviado da CNN ao Zimbábue mostrou que no país africano as fitas cassete — que, numa medida extrema e muito criticada, foram banidas do "Dicionário Oxford" — ainda são o formato dominante. Devido à frágil economia do país, boa parte da população não migrou para os CDs e muito menos para os tocadores de MP3. Por isso, as fitas são o meio escolhido por ar$locais para divulgarem seus trabalhos.
A reportagem da CNN mostra ainda que elas são valorizadas também por dificultar a pirataria — ironicamente, no começo dos anos 1980 as gravações caseiras em fitas cassete foram combatidas pela indústria fonográfica americana, através da controversa campanha "Home tape is killing music" ("Gravações caseiras estão matando a música").
Foi essa irregular e fascinante trajetória que motivou os diretores Zack Taylor e Seth Smoot a criarem o projeto do documentário "Cassette". Previsto para ser lançado até o início de 2013, ele vai contar a influência das fitas no rock alternativo e no hip-hop, incluindo também uma visita ao Zimbábue.
Enquanto isso, as fitas seguem povoando o universo pop, em vários produtos, de bolsas a capa protetoras para iPhones ou iPods. Um uso bastante criativo das fitas tem sido feito pela artista plástica americana Erika Iris Simmons. Na série "Ghosts in the machine", ela recria imagens de ícones da música pop (Bob Marley, John Lennon, Jimi Hendrix etc) usando apenas fitas coladas em telas brancas.
— Adoro a ideia de pegar uma fita cassete e tirar de dentro dela uma imagem conhecida — conta Erika, que se diz influenciada pelo trabalho de Vik Muniz. — Não sou nostálgica, mas sou apaixonada por fitas cassete. A emoção de ouvir uma música no rádio e correr para o gravador para capturá-la me fascina até hoje.

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Foto depois da festa.